Escrever sobre Octavio Paz não é tarefa simples, principalmente quando se trata de uma tese de doutorado realizada por uma historiadora que se dispôs a entrar na seara da literatura. No entanto, apesar das inúmeras análises já produzidas sobre o autor mexicano, considerado um dos expoentes maiores da literatura latino-americana, Priscila Dorella conseguiu trazer a público uma contribuição original, mesmo em relação ao trabalho de outros historiadores brasileiros que, como ela, têm se dedicado ao estudo da vida e da obra desse autor. A originalidade consiste na abordagem da sua figura pública e inserção do escritor nos meios de comunicação.
A decisão de escolher como objeto de pesquisa um personagem cultuado é admirável, mas dispor-se a enfrentar dois aspectos de sua atuação que suscitaram e continuam suscitando debates apaixonados implica assumir o desafio de realizar uma análise também sujeita a polêmicas.
Octavio Paz é uma figura canônica entre os latino-americanos, e não se desconstrói um cânone impunemente, embora seja esta a tarefa da investigação crítica que um acadêmico tem o compromisso de realizar. Portanto, cabe destacar também este mérito do trabalho.
O livro representa uma contribuição importante para os estudos sobre América Latina porque, além do amplo trabalho de pesquisa de fontes e rigorosa análise dos documentos, o texto motiva o leitor a refletir sobre os debates em torno de questões complexas da atuação de Octavio Paz que revelam ambiguidades.
Como mostra a autora, o escritor produziu muitos ensaios de natureza política e se definia como liberal democrata num momento em que grande parte dos intelectuais latino-americanos se identificava com a ideia de revolução. Suas posições políticas eram contestadas pelas esquerdas, mas passaram a ser alvo de críticas de maior amplitude a partir do momento em que se aproximou de setores políticos antidemocráticos.
O terceiro capítulo do livro, referente à inserção de Octavio Paz nos meios de comunicação, é surpreendente: sua faceta midiática (pouco conhecida fora do México e não abordada em outras análises conhecidas entre nós) explica o acirramento das polêmicas em torno de suas atitudes a partir da década de 1980.
Os que cultuam sua obra consideram irreverência abordar aspectos que possam comprometer a imagem do escritor reverenciado. Mas como a crítica acadêmica não convive bem com a idolatria, as considerações da autora são muito procedentes e elucidativas para a melhor compreensão da vida e obra desse homem que foi, sem dúvida, um grande literato.