A relação entre fé e razão não é uma relação qualquer. Ao contrário, ela caracteriza desde o princípio exatamente o campo de tensões nos quais se movimenta o pensamento religioso em geral. A partir de uma contraposição inicial que manteve a fé e a razão em campos completamente opostos, passando pela paulatina reconciliação de fé e razão no interior do pensamento medieval e pela assunção secularizada de dimensões de fé no interior do predomínio moderno de uma razão espiritualizada, até chegar na contemporaneidade a uma possibilidade de pensar a fé para além de toda e qualquer racionalidade previamente constituída, ou seja, para além das amarras de uma razão imbuída da tarefa de reter a fé sob as amarras de categorias previamente instituídas, fé e razão são irmãs siamesas em permanente contato e traumáticas tentativas de separação. Não há simplesmente como considerar o problema do sagrado no Ocidente sem ao mesmo tempo levar em consideração essa relação.
Assim, a coleção “Fides et ratio”, lançada agora pela editora Via Verita, não faz outra coisa senão seguir o rastro de uma indicação histórica fornecida pela própria tradição. Iniciar tal coleção com o volume A redenção de Deus de Alexandre Marques Cabral e Jonas Resende, por sua vez, é trazer o mesmo tempo o diálogo entre razão e fé para o interior de novos campos de discussão. Nesse livro, o que eles fazem não é simplesmente reconstruir contextos bíblicos ou se manter no interior do campo já bem mapeado da teologia sedimentada. Seu esforço é muito mais o de pensar o fenômeno religioso em seu sentido mais originário, ainda que esse sentido precise colocar em questão os dogmas de uma visão empobrecedora de Deus. A redenção de Deus é um convite a escutar o sagrado das escrituras na possibilidade da escrita para além do texto. Fé e razão aqui se irmanam como Deus e diabo em nome de uma inocência reconquistada. Não apenas para a fé, mas antes de tudo para a razão. Que essa inocência conquiste a todos os homens de bom coração.